Rosas e Champanhe - Capítulo - 10.3
Após passar por mais algumas estações, Yiwon foi o primeiro a sair do trem quando chegou ao seu destino. Mais uma vez, Caesar o seguiu, acompanhado pelos membros da organização. Assim que o último membro da tripulação desceu, o trem correu freneticamente sem passageiros a bordo. Yiwon caminhou em direção à livraria com um sentimento de amargura, sem dizer uma palavra.
A conhecida livraria da cidade tinha uma seleção de livros tão grande quanto seu tamanho. Estava sempre lotada de clientes e tinha muita gente entrando e saindo, apesar de ser de manhã. Depois de passar por um homem que acabara de sair, Yiwon entrou e imediatamente começou a procurar nas estantes o livro que ele queria. Em outra ocasião, ele teria aproveitado e olhado novos livros ou simplesmente comprado um livro por hobby e sentado em uma cadeira separada na livraria para desfrutar do lazer que é ler, mas hoje não seria o caso. A razão para isto era óbvia: o enorme homem, que o seguia de perto.
Yiwon caminhou em linha reta, ignorando Caesar olhando ao redor. Seu propósito era muito claro. Yiwon rapidamente olhou para uma certa estante, encontrando o lugar onde os livros relacionados à lei eram dispostos. Pegou um livro que chamou sua atenção e folheou o conteúdo. Depois de escolher alguns livros, virou a cabeça e não avistou Caesar. Yiwon inconscientemente olhou ao redor e o encontrou parado não muito longe. Para ser mais preciso, viu um grupo de homens de terno preto montando uma barricada e imaginou que Caesar estaria ali. Como esperado, depois de um tempo, uma cabeleira loira platinada apareceu.
Estava certo.
Quando se virou, ouviu uma voz o chamando.
— Sr. Advogado.
A voz ressoou na livraria silenciosa, e Yiwon não pôde deixar de levantar uma sobrancelha. Como se estivesse o observando todo o tempo, Caesar caminhou entre os homens, que abriram caminho imediatamente.
— É um presente.
Com um sorriso, Yiwon olhou para o livro que lhe era oferecido.
[QUALQUER UM PODE COZINHAR: receitas fáceis]
De um lado da testa de Yiwon, um vaso sanguíneo saltou.
— Não preciso.
Após responder rispidamente, Yiwon imediatamente se virou. Ao relembrar as memórias embaraçosas que havia enterrado daquela fatídica noite, seu estômago se sentiu embrulhado. Se continuar assim, serei atormentado pelo resto da vida.
… Pelo resto da vida?
Ele franziu a testa diante do pensamento que passou por sua mente. Se dirigiu ao caixa, parando de frente para a funcionária que estava atrás do balcão e colocou os livros.
— Por favor, veja quanto dá isso.
Quando Yiwon colocou os livros na bancada, a funcionária começou a verificar o valor de cada livro, um por um. Enquanto a observava fazer o cálculo em silêncio, um livro de repente atravessou os olhos de Yiwon. O rosto de Yiwon, que inadvertidamente pegou o livro, estava se contorcendo. Atrás dele, Caesar.
— Coloque isso junto.
Caesar riu brilhantemente, tomando a liberdade de atirar o odioso livro de receitas para cima dos outros. Não ria assim de um assunto que me deixa de estômago virado! Yiwon pensou interiormente e abriu a boca para ele com um olhar sombrio.
— O que diabos você está fazendo? Eu não preciso disso.
A reação de Caesar foi inesperadamente séria.
— De jeito nenhum. Você realmente precisa. Vai morrer de intoxicação alimentar algum dia.
Vendo-o balançar a cabeça com um sorriso, sua boca se contraiu.
— Tudo bem. Eu vivi uma boa vida até agora. Não vai acontecer nada no futuro.
— A vida é mais preciosa que o orgulho. Reconsidere, é sério.
— Deixe de ser tão barulhento. Por favor, apenas o coloque de volta no lugar.
— Eu pesquisei e parece ótimo. São pratos que até alguém experiente como você pode fazer.
— Coloque-o de vol….!
— Senhor.
Yiwon, que ficou bravo com a interrupção repentina, parou e virou a cabeça. A funcionária olhou para eles com um rosto inexpressivo.
— São 1.324 rublos.
Yiwon empurrou o pacote que a funcionária lhe entregou para o lado e apressadamente tirou sua carteira do bolso. Como? 1.300? Depois de entregar o dinheiro, Yiwon inclinou a cabeça pensando que os números eram diferentes dos cálculos que ele havia feito. Ao receber a nota fiscal que a balconista lhe entregou junto com o troco, imediatamente virou a cabeça para verificar o interior do pacote. Lá estava ele. O livro ‘QUALQUER UM PODE COZINHAR: receitas fáceis’ brilhando orgulhosamente na sacola de papel.
*
Yiwon irradiava a mais pura raiva de seu corpo enquanto caminhava violentamente por um beco em ruínas com poucas pessoas. O pacote em suas mãos continha um livro de receitas culinárias inúteis, em conjunto aos livros jurídicos.
Por que tenho que gastar 480 rublos em um livro que nunca vou ler?
Além disso, este livro inútil é escandalosamente caro para um livro de apenas algumas páginas. A espessura é mais fina do que a espessura de um dedo! Como um livro desses pode ter o preço equivalente ao de um livro judicial?
Estava andando o mais rápido que podia, tentando aliviar seu ressentimento, quando Caesar, que o estava seguindo, falou.
— Estude uma página por dia e você estará livre de perigo.
Quando Yiwon o encarou com olhos repletos de rancor, Caesar lhe mostrou um sorriso.
— É trágico morrer comendo sua própria comida.
Talvez você queira experimentar a miséria de ser espancado até a morte com um livro de receitas?
Ele olhou para o livro de receitas de capa dura e pensou. De repente, algumas crianças correram pelo beco gritando. Sem poder evitá-los, os dois foram cercados por garotos. Olhando para os rostos sujos e roupas velhas, Yiwon logo percebeu que se tratavam de crianças de rua. Estrangeiros e ricos são bons alvos para eles. Estes meninos vivem roubando carteiras nas ruas. Foi quando Yiwon tentou se desviar das crianças que se aproximaram falando alto, batendo a neve de suas roupas e querendo limpar seus sapatos.
De repente, Caesar golpeou de forma impiedosa o garoto que correu em sua direção. O corpo frágil do menino, que parecia não se alimentar direito, foi atingido pelo golpe e voou para longe sem proferir um só gemido. Yiwon ficou chocado com a situação inesperada. Não houve sequer tempo para questionar o que o homem estava fazendo. Caesar imediatamente tirou uma Glock do bolso e colocou a arma na testa de outro que estava segurando seu casaco. Yiwon, que estava observando a cena, arregalou os olhos e as crianças assustadas gritaram e fugiram.
Naquele momento, Yiwon congelou onde estava. O impossível estava acontecendo bem na frente de seus olhos. Caesar olhou para o garoto sem hesitar. A arma permanecia apontada para a cabeça do menino. Os arrepios que estava sentindo antes correram por todo seu corpo. Em sua frente, estava um homem sem expressão no rosto apontando uma arma para uma criança tão jovem de maneira implacável. Um rosto que não mostra alegria, raiva, tristeza ou qualquer emoção no momento em que está prestes a tirar a vida de outra pessoa.
Com o rosto frio e inexpressivo, Caesar permaneceu apontando para o menino.
Houve um clique e a trava da pistola foi liberada. Naquele momento, Yiwon percebeu. O homem puxaria o gatilho sem vacilar.
— Pare!
Tardiamente, Yiwon tentou interrompê-lo com o grito alto. Em um instante, um tiro medonho cortou o ar.
— Urgh!
Involuntariamente, Yiwon cobriu o menino. Ele poderia ter atingido o jovem, mas Caesar não reagiu de nenhuma maneira em particular. Em vez disso, ele apenas olhou para os dois com o rosto franzido.
— O que você está fazendo? Você quase se machucou.
— O que você está fazendo? Você está tentando atirar em uma criança!
Yiwon gritava, enquanto tapava o corpo do menino, Caesar não disse nada.
— Ele me tocou.
— E daí?! No que diabos você está pensando para apontar uma arma para uma criança só por causa disso?
Caesar ainda olhava para Yiwon com uma expressão confusa. Era como se não entendesse por que Yiwon estava tão zangado com ele.
— Eu não sei por que você me critica. Eu só fiz o que tinha que fazer.
— Atirar em uma criança?
Diante da voz áspera de Yiwon, Caesar perguntou friamente.
— Qual é a diferença entre uma criança e um oponente?
Yiwon ficou sem palavras. Foi a primeira vez que ele, como advogado que ganha a vida com suas palavras, ficou sem elas. No entanto, Caesar não deu tempo a Yiwon para organizar seus pensamentos.
— Se isso é tudo que você tem a dizer, saia do caminho.
Caesar apontou a arma novamente. Desta vez, ele pretendia atirar no menino. Surpreso, Yiwon, puxou a criança e a colocou atrás de suas costas. Tentou dizer-lhe para fugir, mas era impossível. Yiwon virou a cabeça apressadamente para olhar para o menino e viu que suas calças velhas estavam encharcadas. O menino estava congelado no lugar, incapaz de chorar e com as calças urinadas. Era impossível para a criança escapar. Yiwon mordeu o lábio e olhou para Caesar novamente.
— Se quer assim atirar em alguém, então atire em mim.
— O quê?
Caesar fez uma pausa e franziu a testa. Yiwon olhou diretamente para ele e disse com uma voz aguda.
— Você não consegue entender? Se vai atirar nesse garoto, atire em mim primeiro! Eu te bati, lembra? De acordo com o que disse, eu deveria ser sumariamente executado. Por que você não atira?
Caesar olhou para ele sem dizer uma palavra. Yiwon foi sincero. Ficou claro que se ele puxasse o gatilho como fez da última vez, Yiwon não o evitaria.
Um silêncio pesado permaneceu entre os dois. Caesar de pé, com a arma apontada para a criança; a criança, congelada no lugar; Yiwon, olhando para Caesar enquanto bloqueiava o caminho entre ele e a criança; e nenhum dos capangas de Caesar, que continuavam a acompanhá-los, falou nada.
O vento e a neve vagavam ao redor, fazendo um zumbido estrondoso. Enquanto os membros da organização os observavam sem fazer um ruído sequer, Caesar, que estava olhando silenciosamente para Yiwon, abaixou sua arma. Ao mesmo tempo, o menino em pânico se apressou e fugiu. Yiwon olhou para trás e, depois confirmar que o menino havia fugido, o encarou novamente.
Caesar tinha novamente no bolso a arma que empunhava mais cedo. A tensão foi liberada dos ombros tensos de Yiwon. Ele estava tomado de raiva. No momento em que abriu a boca para dizer algo, Caesar olhou para cima do ombro de Yiwon e de repente se moveu. Inconscientemente perturbado pela ação inesperada, Yiwon o seguiu apressadamente e olhou para trás. Ele teve a ideia assustadora de que talvez Caesar fosse atirar na criança em fuga, mas estava errado.
Caesar se inclinou e pegou algo meio enterrado na neve. Assim que olhou de perto, Yiwon descobriu a identidade deste “algo”. Era o pacote de livros que Yiwon tinha jogado de lado. Caesar, que pegou os livros que haviam sido jogados no chão devido à situação tensa, limpou a neve e levantou a cabeça. Ele se aproximou casualmente de Yiwon e lhe ofereceu o pacote. Sua ação seguinte foi completamente inesperada. Yiwon ficou sem palavras com as palavras e expressão de Caesar que se seguiram.
— Você não pode perder isso… O livro que vai salvar sua vida, certo?
Caesar falou com uma voz leve e sorriu para Yiwon. A súbita mudança o deixou atordoado. Antes que percebesse, de alguma forma o homem que há pouco brandava uma arma havia voltado a ser o Caesar habitual. Soltou piadas provocativas para Yiwon com um lindo sorriso nos lábios.
Foi difícil para Yiwon se ajustar à terrível sensação incongruente que vinha do homem. Se não fosse o leve cheiro de pólvora que ainda permanecia na ponta de seu nariz, teria acreditado que tinham sonhado de olhos abertos. Como ele consegue fazer isso? Como ele pode mudar tão de repente depois de tentar matar uma criança? Yiwon piscou os olhos, sentindo-se um pouco tonto.
— Você… você… não sente nada?
Com a pergunta de Yiwon, Caesar inclinou a cabeça.
— O quê?
Yiwon não conseguiu conter suas emoções e gritou.
— Quer dizer que não sente nada mesmo depois de fazer isso com uma criança? Como pode ser tão indiferente? Não importa se você é o chefe da máfia, como você pôde ser tão brutal com uma criança e apontar uma arma para um menino assim…!?
Yiwon, que estava gritando, finalmente se acalmou. Caesar ainda estava olhando para ele com um olhar de questionamento. Por um momento, uma sensação de vazio tomou conta de Yiwon. Sentiu-se como um tolo por estar com raiva. Não importa o que dissesse, esse homem nunca entenderia.
Yiwon sabia que não deve demonstrar simpatia por crianças de rua. No entanto, o que Caesar fez não foi uma simples sanção. Para ele, a vida não significa nada.
Mesmo que seja a de uma criança.
Assim que ele fechou a boca e não disse mais nada, um telefone tocou. Um dos subordinados atendeu o telefonema e rapidamente se aproximou, o informando.
— Desculpe, Czar. O carro está esperando aqui perto. O que devo dizer?
Quando Caesar virou a cabeça, viu um sedã familiar e uma van ao lado dele com os faróis acessos. Caesar assentiu e voltou seu olhar para Yiwon.
— Podemos voltar? Já terminou o que tinha que fazer?
Yiwon, que tinha permanecido em silêncio até então, abriu a boca para Caesar, que prontamente estendeu a mão.
— Eu terminei. E vou sozinho.
Caesar franziu a testa. Yiwon exalou asperamente com a voz embargada.
— Quê? Você não pode me ouvir? Já disse que vou sozinho.
Yiwon agarrou violentamente o pacote que Caesar estava segurando e se virou. Caesar não se atreveu a parar Yiwon. Apenas olhou para suas costas enquanto ele se afastava. Yiwon podia sentir o olhar de Caesar sobre ele. Mas não olhou para trás. Afinal, esse homem nunca vai entender porque estou com raiva.
O vento soprou de repente e Yiwon, involuntariamente, levou sua mão para o topo da cabeça. Ele sentiu os pelos naturais macios e fofos. A imagem de Caesar cobrindo sua própria cabeça com o Valpeak surgiu diante dos seus olhos. Mesmo naquele momento, depois de tudo, Yiwon só consegui ver Caesar com esses olhos.
Mas está errado.
Yiwon andou e andou, cada vez mais rápido, sentindo uma extrema sensação de disparidade com aquele “eu” oculto em Caesar que ele nunca tinha visto antes. De repente, percebeu que uma camada de neve espessa empilhava-se pesadamente em seus ombros.
°°°
Era tarde da noite quando Yiwon voltou para a mansão. Ele havia caminhado da livraria até a frente da casa, assim como ao longo do amplo caminho do jardim que levava do grande portão até a porta da mansão. Caesar olhou pela janela, até finalmente vê-lo chegar em casa depois de algumas horas. Pouco tempo depois, um membro da organização que estava seguindo Yiwon bateu na sua porta.
— Ele não fez nada de especial, apenas caminhou.
Caesar acenou com a cabeça para o breve relatório. O subordinado logo abaixou a cabeça e saiu do quarto. Caesar pegou um charuto e o acendeu. Inalou a fumaça amarga em seus pulmões, mas a sensação complicada que estava sentindo não foi embora.
O que diabos eu fiz de errado?
Pensou sobre isso várias vezes, mas não conseguia entender. Caesar apenas fez o que tinha que fazer. Aqueles que tropeçam devem ser eliminados. Por que deveria ser diferente só porque se trata de uma criança? Por que ele estava com tanta raiva?
Caesar ergueu as sobrancelhas e voltou a inalar a fumaça. Os pensamentos iam e vinham, mas não havia resposta.
°
Continua…